Editada no dia 17.10.19, a Medida Provisória 899/19 regulamenta a “transação tributária” prevista no artigo 171 do Código Tributário Nacional. A chamada de MP do Contribuinte Legal possui efeitos imediatos mas que precisam ser convalidados pelo Congresso.

 

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Introdução à MP do Contribuinte Legal

Com o objetivo de definir normas para a celebração de transação tributária entre União e contribuintes inadimplentes, o Presidente Jair Bolsonaro editou a Medida Provisória n. 899/19.

Diferentemente de parcelamentos previstos em Leis editadas em anos anteriores, a MP do Contribuinte Legal é restrita aos casos que especifica ou àqueles devidamente regulamentados.

Além de depender de aprovação do Congresso Nacional para validação definitiva, seus dispositivos ainda dependem de regulamentação dos órgãos administrativos, sendo que os critérios são bastante rigorosos.

 

O que é uma Medida Provisória

Uma medida provisória é um ato normativo editado pelo Presidente da República, em casos de relevância e urgência, e tem força de lei. Produz efeitos imediatos dependendo, contudo, de aprovação do Congresso Nacional para se transformar em lei.

Prevista na Constituição, as MP’s são uma ferramenta de instituição de políticas públicas imediatas que dependem de serem referendadas pelo Congresso. Seu prazo de vigência é de 60 dias, prorrogáveis por um idêntico período.

 

Com base nesse dispositivo é que foi editada a MP do Contribuinte Legal cujo texto, para vigência definitiva, dependerá de aprovação do Legislativo – o que significa dizer que, se a norma não for convalidada, daqui a algum tempo a leitura de cenário passa a ser diferente da atual.

 

O alcance da MP do Contribuinte Legal

Embora tenha causado muitas expectativas para os contribuintes que sofreram autuações fiscais recentes, a MP do Contribuinte Legal não é nem de longe tão benéfica quanto foram os parcelamentos extraordinários editados em governos anteriores (REFIS, PAES, PAEX, Refis da Copa etc).

Basicamente a MP do Contribuinte Legal trouxe previsão de duas situações em que a transação será possível: em relação aos débitos tributários tidos como irrecuperáveis ou de difícil recuperação ou, ainda, aqueles litígios classificados como relevante e disseminada controvérsia jurídica.

Importante ressaltar que a norma em questão se aplica apenas a tributos administrados pela Receita Federal ou créditos cuja cobrança incumba à PGFN, PGF ou PGU. Vamos às hipóteses.

Transação em dívida ativa

Para que seja possível a transação de dívida inscrita em dívida ativa, é necessário que ela seja classificada como irrecuperável ou de difícil recuperação. Essa é uma classificação de rating definida pela Portaria MF 293, de junho de 2017.

Dessa forma, não basta que uma dívida esteja vencida e inscrita em dívida ativa para que seja elegível ao parcelamento: ela precisa, também, ter um rating negativo de crédito – ou seja, a União só negociará em cima daqueles créditos que são difíceis de serem recebidos.

Para os casos em que couber a transação, a dívida poderá ser parcelada em até 84 meses, prazo que poderá se estender para 100 meses nos casos de pessoas físicas, microempresas ou empresas de pequeno porte.

Nestes casos a iniciativa da proposta de acordo pode partir tanto do órgão público quanto por parte do contribuinte.

É importante observar que determinadas situações são impeditivas de adesão aos parcelamentos como, por exemplo, os casos em que a transação prejudique a livre concorrência ou, ainda, na hipótese de ocultação de bens pela via da “blindagem patrimonial“.

Dá-se destaque, também, ao fato de que a simples proposta de transação não suspende a exigibilidade dos créditos tributários de forma que a obtenção da CND Federal não é automática e dependerá de aprovação do pedido.

 

Transação no Contencioso de Relevante e Disseminada Controvérsia

A segunda situação possível de parcelamento prevista na MP do Contribuinte Legal ocorrerá nas grandes causas tributárias que impactam um grande número de contribuintes.

Não é raro que demandas ocorram em série e, nestas hipóteses em que a União vislumbra uma possível derrota, celebrar um acordo passa a ser uma opção vantajosa.

Nesta situação, a adesão à proposta de parcelamento dependerá de edição de ato normativo convidando os contribuintes interessados a participarem do programa de forma que a norma não é autoaplicável.

Assim como no parcelamento de dívidas ativas, as transações neste caso poderão prever o pagamento da dívida em 84 parcelas, prorrogáveis até 100 nos casos de contribuintes pessoas físicas, microempresas ou empresas de pequeno porte.

 

Das vedações ao parcelamento

Independente de qual das duas situações, existem descontos que podem chegar até a 70% do valor da dívida, sendo expressamente vedado à União a redução do crédito principal quando já inscrito em dívida ativa.

Além disso, não são passíveis de transação as seguintes situações:

  • As multas aplicadas em casos de sonegação fiscal, fraude, conluio ou situações de reincidência, além das de natureza penal;
  • Os créditos de FGTS ou decorrentes do Simples Nacional
  • Os créditos não inscritos em dívida ativa da União.

Portanto, o que se verifica é que as situações em que serão cabíveis os parcelamentos são bastante restritas e, além de vedações diversas, dependem de regulamentação fiscal.

 

A intenção por trás da MP do Contribuinte Legal

Ao estabelecer que a transação dos créditos inscritos em dívida ativa somente poderá se dar em face de créditos classificados como irrecuperáveis ou de difícil recuperação, a norma estabelece um critério claro: o canal do diálogo só ocorrerá nos casos em que União tiver esgotado os meios de receber os valores que entende devidos.

O objetivo da norma, portanto, pareceu ser criar condições para que a União receba seus créditos em situações de improvável recebimento ou, quando em condições duvidosas (disseminada controvérsia), elimine-se o risco de uma derrota em série.

Não podemos deixar de reconhecer o avanço da medida que, como afirmado, ainda depende do aval do legislativo para se tornar uma lei concreta.

No entanto, como em toda negociação, as partes tendem a obter aquilo que lhes é de maior valor – e foi exatamente isso que a MP do Contribuinte Legal fez: permitiu que a União negociasse com os contribuintes mas nos seus próprios interesses.

É importante destacar que essa visão consta da própria exposição de motivos da MP do Contribuinte Legal na qual se destacou que a medida  “esvaziará a prática comprovadamente nociva de criação periódica de parcelamentos especiais, com concessão de prazos e descontos excessivos a todos aqueles que se enquadram na norma (mesmo aqueles com plena capacidade de pagamento integral da dívida)”.

Isso demonstra uma clara intenção do Governo Federal de não reeditar normas que possam servir de estímulo à inadimplência para ulterior regularização em parcelamentos extraordinários.

Conclusões

Claramente, com a edição da MP do Contribuinte Legal, a intenção do Governo Federal foi de afastar a reedição de parcelamentos extraordinários. Isso sugere que não haverá, nos próximos anos, um parcelamento tão favorável como no passado.

Como a maioria dos contribuintes ativos (empresas em operação) não possui dívidas que se enquadram no conceito de irrecuperáveis ou de difícil recuperação, os parcelamentos previstos na norma tendem a não favorecer estes segmentos.

Para os casos de contribuintes que sofreram autuações fiscais e estão discutido as dívidas nas esferas corretas, resta a alternativa de aguardar a normatização de uma possível transação e, então, avaliar a pertinência de aderir ao acordo.

A recomendação, portanto, é a de manutenção das estratégias de defesa atualmente adotadas até que haja a edição dos atos de regulamentação – e, ainda, da confirmação da aprovação da MP pelo Congresso Nacional.

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